O fato: Um ex-deputado federal e ex-presidente de um partido político, depois de resistir à prisão por oito horas, dentro de sua casa, lançou granadas e efetuou disparos de armas de fogo contra quatro policiais encarregados de cumprir mandado de prisão expedido pelo Supremo Tribunal Federal, tendo dois agentes sido atingidos pelos estilhaços do artefato atirado. O autor, que estava em prisão domiciliar, possuía de vinte a vinte e cinco armas, além de munições, em sua residência. Grife-se que, estando em prisão domiciliar, seu registro de licença de colecionador, atirador desportivo e caçador, por óbvio estava suspensa. O autor confessou ter disparado 50 tiros de fuzil contra agentes federais. Registre-se que, uma semana antes, houvera gravado um vídeo nas redes sociais com xingamentos de baixo calão à ministra Carmen Lúcia, violando as regras explícitas da prisão domiciliar
1. O Direito romano, no conceito de crimen vis publicae, abarcava todos os atos de violência à autoridade do Estado, incluindo a segurança do magistrado e de outros funcionários públicos no exercício de sua autoridade (“Qui dolo malo fecerit quominus judicia tuto exerceantur, aut judicies oportet judicent, vel is qui potestatem imperiumve habuerit, quam ei jus erit, decernat, imperet, faciat”). O crime de violência e de resistência pública era reprimido como crime de lesa majestade (“Maiestatem minuere est de dignitate aut amplitudine aut potestate Populi, aut eorum, quibus Populus potestatem dedit, aliquid derrogare”). A previsão expressa veio com a Lex Plaulia de vi e a Lex Julia de vi, que punia nos tempos primitivos com a morte para os humiliores e de interditio aquae et ignis e a deportatio para os honestiores. O Imperador Henrique VII (1313) considerou rebelles et infideles aqueles que se rebelavam contra seus funcionários (“contra officiales nostros in his quae ad commissum eis officium pertinent”).
2. A Constitutio Criminalis Carolina (1523), cingindo-se às disposições do Direito romano sobre a seditio e o tumultus, punia com pena de decapitação, e em casos mais graves com penas corporais e o banimento (“perigosa, dolosa e perversamente provocasse tumultos do povo contra a autoridade”), as penas eram severas na Idade Média alemã contra a violência feita aos servidores da cidade, tais como guardas, juízes, funcionários públicos e o Direito comum considerava a violatio personarum publicarum em caso especial de vis publica, fazendo a distinção entre crimes especiais de sedição e tumulto, e de resistência à autoridade.
3. A legislação penal italiana reproduziu na sua maior parte o Código Penal francês (1810), com o nomen iuris de rébellion (tem-se o art. 209 do CP Napoleônico com nova redação no art. 433-6 do CP/94: “Constitue une rébellion le fait d’opposer une résistence violente à une personne dépositaire de l’autorité publique ou charger d’une mission de service publique agissant, dans l’exercice de sus functions, pour l’exécution des lois, des ordres d’autorité publique, des décisions ou mandats de justice”).
4. No estudo da evolução do direito comparado, assinala-se que o Código sardo (1859) distinguia o crime de violência contra a autoridade de três formas: “ribellione la coerzione di pubblico ufficiale, l’oltraggio al depositario dell’autorità o della forza pubblica nell’exercizio delle sui funcione o per ocassione di esso”. Os Códigos toscano (1853), no art. 143, § 3º, e Zanardelli (1889), no art. 190, tratavam da Resistenza all’autorità (“Chiunque usa violenza o minaccia per opporsi ad un pubblico ufficiale mentre adempie i doveri del proprio ufficio, o a coloro che, rechiesti, gli prestano assistenza,...”) e na mesma direção o Código Rocco (1930), no art. 337, prevê a “Resistenza a un pubblico ufficiale” (“Chiunque usa violenza o minaccia per opporsi a un pubblico ufficiale o ad un incaricato di un pubblico servizio, mentre compie un atto di ufficio o di servizio, o a coloro che, richiesti, gli prestano assistenza, è punito con la reclusione da sei mesi a cinque anni”). O Código Penal suíço (1937), nos arts. 285 e 286, dispõe separadamente os crimes de “Opposition aux actes d’autorité” e de “Violence au menace contre les autorités et fonctionnaires”,que constituem essencialmente a “rébellion” com violência (“gewaltsame widersetzung”) e “rébellion” simples (“widersetzung”), sem violência ou ameaças (“Celui qui, en usant de violence ou de menace, aura empéche une autorité, un membre d’une autorité ou un fonctionnaire de faire un acte entrant dans ses fonctions...”). O Código Penal argentino, no art. 239, muito se aproxima do nosso texto legal, em relação ao tipo de resistência (“[...] el que resistire o desobedecer a un funcionario publico en ejercicio legitimo de sus funciones o a la persona que le prestare assistencia a requerimento de aquél o en virtud de una obrigación legal”).
5. O Código Criminal de 1830, no Título IV (“Dos crimes contra a segurança interna do Império e pública tranquilidade”), criminalizava a resistência em dois dispositivos legais (“Oppôr-se alguém de qualquer modo com força à execução das ordens legais das autoridades competentes”), já prevendo as hipóteses de não efetuação da diligência ordenada ou na hipótese dos oficiais encarregados da execução sofressem alguma violência física ou psíquica (art. 116). E, se a diligência se efetuasse sem qualquer violência física, apesar da oposição (art. 117), a resposta penal seria inferior ao marco legal máximo, de quatro para dois anos.
6. O Código Penal de 1890, no Título II (“Dos crimes contra a segurança interna da República”), no art. 125, é mais elaborado (“Oppor-se alguém, com violência ou ameaças, à execução de ordens legais emanadas de autoridade competente, quer a oposição seja feita directamente contra a autoridade, quer contra seus agentes ou subalternos”) seguindo o modelo de 1830 em relação a não efetuação da diligência e a ocorrência de lesão corporal do executor (art. 124). Inova ao prever “O mal causado pelo executor na repulsa da força empregada pelos resistentes, não lhes será imputado salvo excesso de justa defesa”.
7. O Código Penal de 1940, no Título XI (“Dos crimes contra a Administração Pública”), no Capítulo II (“Dos crimes praticados por particular contra a Administração Pública em geral”), criminaliza a resistência superando o critério anacrônico de equiparação à sedição e à conspiração, próprias das legislações europeias do século XIX (crime contra o Estado ou contra a ordem pública constituída). Assim, manteve-se a similitude redacional no art. 329 (“Opor-se à execução do ato legal, mediante violência ou ameaça a funcionário competente para executá-la ou a quem lhe esteja prestando auxílio”), e prevendo a qualificadora de, se em razão da violência, a ordem legal não se executa (art. 329, § 1º), sem prejuízo das penas correspondentes à violência (art. 329, § 2º). A Lei nº 1.579, de 18 de março de 1952, previu em seu art. 4º, I, uma nova modalidade de resistência pertinente às comissões parlamentares de inquérito (“Impedir, ou tentar impedir, mediante violência, ameaça ou assuadas, o regular funcionamento de Comissão Parlamentar de Inquérito, ou o livre exercício das atribuições de qualquer dos seus membros”), com a cominação das penas previstas no art. 329 do Código Penal. O Código Penal de 1969, no art. 367, §§ 1º e 2º, repetiu o modelo do Código de 1940, apenas dando forma em rubricas laterais a qualificadora e a ressalva da pena à violência. O anteprojeto de 1984 repetia, no art. 340, caput, o texto do Código de 1940, prevendo, nos §§ 1º e 2º, como causa especial de aumento de pena (triplo), se o ato em relação à resistência não fosse executado, aplicada independentemente à violência. O anteprojeto de 1999, no art. 320, § 2º, cria uma qualificadora (“se o ato, em razão da resistência, não se executa: pena – reclusão, de um a quatro anos”). O projeto de Reforma do Código Penal (2012), em seu art. 286, manteve a redação do art. 329 do Código Penal, sendo aumentado o marco mínimo do caput para seis meses, de prisão (detenção). Assim, observa-se a evolução das propostas legislativas de reforma do texto em vigor.
8. Configura o crime do tipo de resistência o ato de opor-se à execução de ato legal de ofício, através do emprego de violência ou ameaça a funcionário competente para executá-lo, ou a quem esteja prestando auxílio. O objeto jurídico da tutela é o interesse pertinente ao resguardo da dignidade, prestígio e bom funcionamento da Administração Pública no sentido de garantir a incolumidade física e a liberdade do funcionário público e da pessoa que eventualmente o assiste no cumprimento do dever legal de ofício contra ato de oposição, ameaçador ou violento, de qualquer pessoa. Haveria, ao mesmo tempo, a proteção do funcionário executor da ordem legal, de caráter pessoal e a proteção funcional ou reflexa, isto é, na medida estrita que representa a liberdade do Estado. O pressuposto é a legalidade do ato praticado. Ver-se-á quando do destaque do elemento objetivo que há um direito-dever de resistir, na esfera de âmbito do possível, diante da execução de ordem ilegal. Registre-se desde a Magna Carta (1215) à Constituição francesa (1791), o princípio de que o cidadão só deve obediência ao detentor do poder “agissant léglement dans les exercicies de ses functíons”. Só se admitia a resistência diante da ilegitimidade do ato claro e abusivo. Registre-se que para a tipificação requer o emprego da ameaça ou violência para a oposição de resistência ao ato legal. O particular deve opor-se no exercício regular de direito e na legítima defesa, quando houver agressão. Vige o princípio da legalidade. É atuar passivo o impedir a colocação de alguns ofensivos verbais que não constituem violência ou grave ameaça (elementares do tipo). Há absorção do desacato e da desobediência, enquanto opera a ação de resistir. O objeto material da ação é o funcionário público e pessoa que eventualmente o assiste, ameaçado ou agredido, no cumprimento da execução de ato legal de ofício (proteção do ato funcional). Trata-se de crime comum, comissivo/omissivo impróprio, de mera conduta, formal, de forma livre, instantâneo, plurissubsistente, pluriofensivo, complexo e unissubjetivo.
9. O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, tanto aquele contra quem a ordem legal deva ser executada, como também, o terceiro que entenda opor-se à sua execução (parente, amigo, colega ou por ratio política ou ideológica). O funcionário público pode ser sujeito ativo desde que impeça a execução de ato outro de funcionário no cumprimento legal de suas funções. O sujeito passivo imediato é o Estado, representado pela União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios; e, mediato, o funcionário contra o qual a violência ou ameaça é praticada no exercício da execução de seu dever legal ou o particular que eventualmente o assiste.
10. Cogita-se do ato positivo de opor-se (obstar, impedir) à execução de ato legal de ofício (amparado pela legalidade e sem excesso na execução), mediante violência (a vis corporalis, força física exercida contra a pessoa do funcionário ou de seu auxiliar, quando o ato esteja sendo executado) ou ameaça (a vis compulsiva, manifestação de causar mal idôneo e grave e não meras ofensas contra a pessoa) a funcionário competente (a execução do ato legal deve ser realizada por funcionário dentro dos limites de suas atribuições legais) para executá-lo ou a quem lhe esteja prestando auxílio (solicitado pelo funcionário e prestado na sua presença e no local da execução do ato). Diante da objetiva análise da moldura do núcleo reitor típico, observa-se, em síntese, a presença dos elementos normativos: a) oposição mediante violência ou ameaça; b) execução de ato legal; c) competência de funcionário executor ou quem lhe esteja prestando auxílio; d) dolo com o especial elemento subjetivo do crime.
11. A oposição denota sempre um ato positivo, inexistindo uma conduta absolutamente passiva. Hungria resume ao lecionar que “a oposição deve ter, na espécie, um caráter militante. A simples desobediência ou resistência passiva (vis civilis) poderá constituir outra figura penal”. Assim, a recusa de declinar o nome, de entregar o objeto, de abrir as portas, de deitar no chão, constitui mera resistência passiva, que, em tese, poderia configurar o crime do tipo de desobediência (art. 330 do CP) e os gestos e as palavras ultrajantes configuram o crime de desacato (art. 331 do CP). No que tange à ameaça (vis compulsiva), pode ser realizada oral ou por escrito, crível e grave e, quanto à violência (vis corporalis), deve ser dirigida à pessoa do funcionário ou de quem o auxiliar e não à coisa que seja instrumento material para obstaculizar o cumprimento da ordem legal. Nossa legislação difere da peninsular em que a violência não deve ser necessariamente contra o funcionário, pois exige expressamente “a funcionário”. Registre-se que o grau de violência ou ameaça deve ser aferido pela capacidade de restringir a liberdade física ou moral idônea a obstaculizar a execução do ato legal (exercício legítimo da função).
12. É uma vexata quaestio a execução de ato legal. A resistência somente se tornará legítima quando flagrante a ilegalidade, formal ou material, do ato de ofício. Neste sentido, há crime impossível, quando da impossibilidade de cumprir a ordem decorrente de questões burocráticas ou materiais. Inexiste crime de desobediência na recusa do advogado prestar informações sobre fatos no processo em que funcionou, bem como suas relações pessoais com o seu cliente. Diante do art. 5º, LVIII, da CF/88, ninguém está obrigado a produzir prova contra si mesmo, isto é, de autoincriminar-se. A oposição deve ocorrer no momento da execução do ato, tendo como pressupostos a atualidade ou iminência de parte de funcionário competente ou quem lhe esteja prestando auxílio, que se cuidando de ato individualizado, com destinatário certo, a resistência se inicia com o exercício real e efetivo de sua função executiva. A proteção ao extraneus que presta auxílio é ditada pelo desdobramento da competência funcional concreta, não se incluindo aquele particular que é facultado prender em flagrante, pois não está prestando auxílio. De outro lado, está a questão relativa à determinação dos limites ou da existência ou inexistência do direito de resistir legalmente a ato arbitrário de um funcionário público ou quem lhe esteja prestando auxílio.
13. Diante da competência funcional podem-se apresentar duas situações: a) o ato requer uma ordem especial de que o agente é mero executor e, ainda que possua função genérica, só poderá atuar em razão de uma autorização específica. Pode ocorrer que a ordem seja substancialmente ilegal, havendo conflito entre o dever de obediência, normalmente privado de examinar o conteúdo da ordem, e o direito do cidadão de não ser objeto de atos arbitrários; e, b) a lei pode deixar a determinação do funcionário executivo a resolução de um caso determinado e que essa resolução em concreto seja arbitrária. Repete-se a indispensabilidade da legalidade, substancial e formal, do ato do funcionário público que obra com o emprego da violência ou ameaça, de mal injusto e grave.
14. Para a solução dos casos de ilegalidade substantiva surgiram dois posicionamentos: a) o que Carrara qualificou de reacionário, porque a ordem emanada de autoridade deve ser sempre obedecida. Os cidadãos não possuem o direito de discutir o ato diante da presunção de legalidade, só podendo reclamar depois da execução. O princípio da obediência passiva incondicional vigorou em períodos de autocracia, tendo a resistência privada sido reconhecida como uma faculdade do cidadão romano nos tempos da República. Os jurisconsultos defendiam: “vim vi repellere licet”. Tal direito foi consagrado na Magna Carta e na Constituição francesa de 1791; e, b) o denominado liberal, que defendia Carrara, que afasta a anterior, na direção de que ninguém é obrigado a suportar um dano pelo ratio de ser reparável. Trébutien, no Cours élémentaire de droit criminel, sublinhava a insuportabilidade como certeza de ilegitimidade e no caso de dúvida seria resolvido a favor da autoridade (princípio da autoridade). A doutrina aponta que ambos os critérios extremos oferecem dificuldades. A nossa Constituição Federal, no Título II, relativo aos Direitos e Garantias Fundamentais, no art. 5º, II, prescreve que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”, adotando a tese liberal, ao requerer no tipo que o funcionário competente atue na execução de ato legal. Consigne-se o direito de resistir ao ato ilegal ou arbitrário, que se traduz ato contrário aos deveres do cargo, no excesso ou abuso de poderes conferidos ao funcionário público. Repita-se que o cidadão não é escravo e tem sempre o direito de resistir a todo ato abusivo e de arbítrio, repelindo o holocausto às garantias legais e constitucionais, na defesa de sua dignidade e de sua liberdade contra atos de prepotência. Sublinhe-se que não se confunde ilegalidade com injustiça do ato. Hungria lembra que Farinacio reclamava a punição daquele que se rende passivamente à ilegalidade (“privatus non solum impune potest resistere officiali, cum aliquid contra jura, imo quod punitur si non resistit”). É atípica a resistência à denominada ilegalidade da “prisão para averiguações”. Diante de um Estado de Direito, todo cidadão deve resistir ao arbítrio da autoridade pública. Afasta-se a posição da absoluta presunção da legalidade do atuar dos agentes públicos, para relativizá-la, sustentando-se a legitimidade do direito de resistir à execução de ato ilegal. Recorde-se a lição de Magalhães Noronha, no sentido de que “Só há resistência contra ato ilegal; se não o for, a oposição não será lícita, quer seja a ilegalidade patente, quer seja dissimulada”. Hungria defende “[...] a sujeição de um ato ilegal da autoridade constitui autêntica legítima defesa”. No ato de restrição, quanto ao prazo e ao modo de execução da ordem (condução coercitiva), só se admite quando demonstrada a real intenção de descumprimento da ordem judicial. Quando o agente obsta a atuação de autoridade judiciária, órgão do Ministério Público ou membro do Conselho Tutelar, que estão no exercício de função prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente, diante do princípio da especialidade, há incidência no tipo inscrito no art. 236 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990.
15. O elemento subjetivo é representado pelo dolo, vontade livre e consciente de empregar violência ou ameaça a funcionário público ou a quem lhe esteja prestando auxílio, diante do seu dever de ofício, com especial elemento subjetivo do crime, impedir a execução de ato legal. Assim, o sujeito ativo deverá: a) ter a consciência de que o ato é executado por funcionário ou pessoa que lhe esteja prestando auxílio; b) ter consciência de que o ato que está sendo executado é legal. Portanto, há possibilidade da ocorrência de erro sobre os elementos do tipo, excluindo o dolo ou o reconhecimento de descriminante putativa, quando: a) supor, erroneamente, pelas circunstâncias, que não se trata de funcionário público ou de pessoa que lhe está prestando assistência; b) desconhece que naquele momento o funcionário pratica ato circunscrito à esfera específica de suas atribuições; c) está convencido de que a atuação do funcionário ou da pessoa que lhe está prestando assistência é legítima. O § 133, III, do StGB trata normativamente no tipo relativo a resistência contra agentes executores (Widerstand gegen Wollstreckungsbeante) quando o fato do serviço não seja legal ou quando tenha validade o autor ativa falsamente o fato de serviço que seja legal (“Die Tat nicht nach dieser Vorschrift strafbar, wenn die Diensthandlung nicht rechtmäBlig ist. Dies gilt auch dann, wegen der Täter irrig annimmt, die Diensthan dlung sei rechtmäBig”), ou, no§ 133, IV, quando o autor supõe erroneamente durante a comissão do fato de que o ato de serviço não fora legal e houver podido impedir o erro, podendo o tribunal atenuar a pena (“Nimmt der Täter bei Begchund der Tat irrig an, Diensthandlung sei nicht rechtmäBig, und Kennate er dem Irrtum vermêiden, so Kann das Gericht die Strafe nach seinen Ermessen mildern”). O momento consumativo se dá com a prática de qualquer ato que constitua violência ou ameaça à pessoa do funcionário na esfera de âmbito de sua competência funcional, ou de quem ele esteja prestando auxílio, como meio de oposição a execução de ato legal, independente da real e efetiva realização do fim colimado (ato funcional), o que constitui maior desvalor do obrar típico (art. 329, § 1º, CP). O emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido, sem qualquer ressalva, viola o princípio da proporcionalidade entre o tipo descrito e a pena cominada. Admite-se a tentativa (plurissubsistente). O exaurimento do crime se constitui em elemento qualificador. É a hipótese da não execução do ato legal de ofício, diante da violência ou ameaça a funcionário competente ou a quem lhe esteja prestando auxílio, que corresponde ao exaurimento, configurativo do maior desvalor, em razão exclusiva da oposição do agente e não da mera desistência funcional (art. 329, § 1º, CP).
16. Aduza-se o que prescreve o Código Penal: art. 163 (“Destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia. Dano qualificado: parágrafo único: I. se o crime é cometido: com violência à pessoa ou grave ameaça; II. com emprego de substância inflamável ou explosiva, se o fato não constitui crime mais grave; III. contra o patrimônio da União...”); art. 121, § 2º: homicídio qualificado/ art. 14 (“Tentado, quando iniciada a execução não se consuma diante de circunstâncias alheias à vontade do agente”) e emprego de algemas (Súmula Vinculante nº 11 do STF). Prescreve o § 2º do art. 329 do Código Penal que “as penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes à violência”. Assim, quando da violência (vis corporalis) empregada no ato de resistir resultar lesão corporal ou morte, dá-se o cúmulo real de penas. Grife-se que a Lei nº 13.964, de 24 de dezembro de 2019, prescreve pena de reclusão, de três anos a seis anos, e multa, quando o resistente “Possuir, deter, portar, ...., ter em depósito, ..., manter sob sua guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição de uso restrito, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar”. Portanto, nos crimes de ameaça, desacato e desobediência (vis compulsiva), há a absorvição pelo de resistência. A pena cominada ao crime do tipo de resistência simples é de detenção, de 2 (dois) meses a 2 (dois) anos. Na hipótese da qualificadora, a pena é de reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos. A ação penal é de iniciativa pública incondicionada.
17. Será que, na hipótese de o autor do ilícito penal ser negro e residente em uma comunidade carente teria o mesmo tratamento pelos agentes da autoridade? Resposta: Na hipótese de estar vivo, seria transferido para uma penitenciária federal, em regime disciplinar diferenciado fechado. Precisamos passar o Brasil a limpo!
Álvaro Mayrink da Costa
Doutorado (UEG). Professor Emérito da EMERJ. Desembargador (aposentado) do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.
Caro amigo AMC,
Parabéns pela abordagem do caso concreto em análise jurídica exemplar.
Abraço
Talvane